A decisão do ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), de liberar 149 presas pelos atos golpistas de 8 de janeiro no Dia Internacional da Mulher foi vista por especialistas ouvidas pela Folha como um ato com simbolismo político, mas embasado juridicamente.
Segundo as criminalistas, o ministro estava no prazo para a análise das prisões temporárias das acusadas de participar de ações contra o Estado democrático de Direito e a soltura ocorreu dois meses após os ataques pela excepcionalidade do caso, com número maior de processos e provas a serem analisadas.
Ao todo, 489 mulheres foram detidas entre 1.406 presos no dia 9 de janeiro, no dia seguinte aos ataques às sedes dos três Poderes em Brasília.
Para a advogada criminal e dos direitos das mulheres Maira Pinheiro, há um “volume atípico de presos, provas e atos processuais a serem praticados” que gera uma fila e que, “até certo ponto, explica porque levou dois meses para que os pedidos de liberdade dessas mulheres fossem julgados”.
Pinheiro diz considerar que, apesar de poder representar um ato político, não há problemas na priorização de um grupo que já passa por vulnerabilidades tanto nas violações de direitos em penitenciárias quanto na morosidade da análise dos casos pelo Estado.
“Acho que a grande questão para mim é que há várias outras mulheres com questões humanitárias bastante urgentes, que também estão presas por questões políticas, pela criminalização da pobreza, pela seletividade racial e de classe do sistema de Justiça criminal”, diz a advogada.
Ela afirma que o Código de Processo Penal autoriza o juiz a decidir a cada 90 dias pela necessidade ou não da manutenção de prisões provisórias —ou seja, Moraes não deixou de cumprir o prazo para análise das manifestações da PGR (Procuradoria-Geral da República) e dos pedidos de soltura.
Moraes esteve com a presidente do STF, ministra Rosa Weber, visitando a Penitenciária Feminina do Distrito Federal na segunda-feira (6), para conversar com as detidas após os ataques golpistas e verificar as condições delas.
Priscila Pamela Santos, advogada criminal, diz não ser possível dissociar o caráter político do jurídico neste caso, e que há um simbolismo na liberação massiva de mulheres na data. Mas afirma haver embasamento jurídico para a decisão.
“As mulheres, especialmente as mães, têm prerrogativa de prisão domiciliar com medidas cautelares, já que apresentam menos periculosidade em relação aos homens mesmo sendo a maioria da população brasileira”, diz a criminalista.
Ela também afirma que a liberação de 149 detentas em um só dia ocorre porque as ações contra elas, parte de todos os processos dos atos golpistas, vieram em um mesmo bloco de manifestações da PGR, ou seja, por serem do mesmo caso, não precisariam de uma análise individual mais rigorosa, especialmente por não serem organizadoras ou financiadoras dos crimes.
A decisão de soltura das encarceradas veio com um comunicado divulgado nesta quarta, no qual a corte diz ter priorizado a análise da situação das mulheres na semana do Dia Internacional da Mulher e apreciou todos os pedidos de liberdade provisória solicitados por presas após os atos.
Com a decisão, chega-se a um total de 407 mulheres soltas até o momento; outras 82 seguem presas.
Antes disso, Moraes já vinha determinando solturas dos detidos pelos ataques realizados em Brasília. Nos dias 27 e 28 de fevereiro, o magistrado determinou a liberação de 173 presos. Eles deverão usar tornozeleira eletrônica e cumprir outras medidas ordenadas pelo ministro, como a proibição do uso de redes sociais.
Como as investigações não apontaram os acusados como financiadores ou executores principais dos atos, Moraes considerou que eles poderão responder em liberdade. O ministro também considerou que a maioria deles tem a condição de réu primário e filhos menores de idade.